ALERTA DE SPOILERS! Antes de ler as notas, leia o capítulo correspondente primeiro!
Olá leitores, fechamos hoje as férias com um novo capítulo de AeXY, tomando um rumo diferente de qualquer outro antes tentado nessa história. As notas a seguir são meio compridas, mas convido aqueles que tiverem (mais) paciência a ler
Sobre o Capítulo
Hoje a verdadeira protagonista do nosso capítulo foi a Serena, que praticamente foi o centro das atenções. E não é pouca coisa. Esse é o capítulo mais longo até hoje, foram cerca de 7.500 palavras e me arrisco a dizer que um dos mais importantes da temporada. Por muito tempo houve vários conflitos sobre quem a Serena seria nessa jornada. Desde que eu assumi o blog como autor de Kalos (antes dos jogos saírem) já havia muitas pessoas me dizendo que gostariam de ver os Contests, e confesso que fiquei muito tentado a acabar seguindo isso mesmo. Infelizmente, não fiz isso, e tenho motivos, que vocês conferem nesse capítulo e abaixo.
A Serena conviveu toda a sua vida com um mundo glamouroso e cheio de falsas aparências, seja com pessoas tentando se aproveitar ou familiares que colocavam notas de dinheiro à frente do amor. Foi uma vida toda devendo usar o vestido mais caro, ou ser a garota mais bonita, ou ser o centro das atenções. Entrar em competições seria como voltar tudo isso de novo. Não que Contests se resumam a isso, mas vejo como ela se sentiria aprisionada dessa forma, porque são competições que valorizam a beleza e as habilidades no palco. Soma-se isso ao fator de que eu já tinha um protagonista coordenador em outra fanfic e estava quase sem ideias. Acabei optando por seguir o esquema dos jogos e cortar os Contests (na época havia também cinco regiões na Aliança com coordenadores, e pensei em não ser repetitivo). Isso nunca impediu a Serena de ser uma personagem cativante por si só, com seus objetivos e sonhos.
Porém, acabei optando algum tempo atrás por tentar algo diferente. Resgatei a ideia dos "Showcase", apesar de serem uma mecânica exclusiva do anime, e trouxe uma competição que julgo muito interessante. Quis trazer tudo por uma visão caricata e absurda, como um reality show de grande influência, mas que esconde por trás do brilho grande acidez e crueldade, como um jogo para ver quem consegue puxar o tapete de quem. Vale lembrar que não significa que essas competições se resumam a isso, mas é como eu quis abordar em especial nessa ocasião, e sob os olhos da Serena.
De brinde, para quem gosta de Contests, podem conferir um pequeno trecho de apresentações, e a primeira vez que vemos alguns Pokémon da Serena em ação. Ah, e não podemos esquecer da Ga Ga. Ela apareceu lá no capítulo 10, contracenando com a Kath, e causou uma reação que gostei muito. Hoje a vemos novamente entrando nos holofotes e podemos ter certeza de que ela aparecerá futuramente, uma vez que é uma treinadora também.
Então agora a Serena é "performer"?
Nope. Pelo menos eu acho que não. Ela participou da competição, mas isso a deixou extremamente confusa e conflituosa. E ela nunca quis se fechar a um único caminho, então é bem difícil. Era apenas um planejamento feito para esse capítulo especificamente. Mas deixarei aí uma enquete para vocês opinarem se ainda querem ver isso mais para frente.
Resultado da enquete
Eu não sei exatamente o motivo dessa enquete, mas é mais uma curiosidade mesmo. Senti que poderia estar deixando a desejar em alguns pontos, mas fiquei satisfeito com os resultados. Primeiro porque vejo que há quem pense que está tudo equilibrado, e como autor fico muitíssimo satisfeito com isso, e não escondo que estou feliz que os personagens se destacam para outros como motivo de apreciação da fic. Como uma fanfic de Pokémon acho que é normal que o que traga todo mundo seja o gosto pelas batalhas, competições e tudo mais. Mas penso que o que mais segura vocês aqui, anos depois, é o jeito de cada personagem, é querer saber como eles enfrentarão essa história e seus próprios sonhos e conflitos pessoais. Espero continuar mantendo os personagens nesse nível de importância. Agradeço a todos que votaram, e logo estarei substituindo a enquete!
— Vai perguntar para mim? — questionou
Ashley de volta.
O grupo se encontrava em uma área
menos movimentada de Cyllage, onde muitas pessoas aproveitavam a calmaria para
praticar seus esportes favoritos. Àquele extremo da cidade era possível ver
onde a metrópole se encontrava com a Conecting
Cave, que com sua grande inclinação marcava a diferença de relevos entre a
parte litoral e central de Kalos.
Algumas crianças utilizavam as
partes menos íngremes da parede da caverna para praticar com a bicicleta, em
algum dos lugares asfaltados e com sinalizações pintadas no solo. Havia ainda
áreas mais altas e mais perigosas, com obstáculos naturais onde apenas alguns
especialistas no esporte se arriscavam. Um pequeno córrego saía por detrás da
caverna e desaguava no mar, criando uma atmosfera reconfortante.
Os cinco jovens estavam relaxando
naquela parte mais pacata da cidade grande. Serena tinha alguns de seus
Pokémons fora da Pokébola, se preparando para a competição que deveria
enfrentar durante a noite.
— Você gosta de bancar a
inteligente. — lembrou Calem. — O que você sabe sobre…?
Ashley respirou fundo.
— Os Showcase são competições bem
antigas por aqui, inclusive inspiraram a forma que os Contests são nas outras regiões. — explicou ela. — Eram competições
antigas exclusivas para moças da nobreza que exibiam suas habilidades, beleza e
empatia com Pokémons.
O rapaz assentiu com a cabeça.
— Hoje são eventos bem populares e
televisionados para o continente todo. — lembrou ela. — Se é um risco sua prima
aparecer na televisão de Kalos, então é um problema.
Ele se aproximou da prima, que
parecia empolgada, enquanto Mikala e Charlie a assistiam treinar.
— Tem certeza que você vai
participar disso mesmo? — disse o rapaz, baixinho.
— Claro que sim! Eu ensaiei a manhã
inteira. — ela concordou, empolgada.
— Digo, seu pai pode assistir à sua
competição. — ele falou, sério.
Ela por um momento ficou em
silêncio e paralisada, como se buscasse demonstrar a reação mais natural
possível, mas sem sucesso.
— Eu sei o que estou fazendo. —
falou, por fim, voltando a seu treino.
Calem respirou fundo e afastou-se.
Tinha um pressentimento ruim, mas resolveu deixar a situação nas mãos de sua prima,
embora sentisse que ela não tinha tanta ideia assim do que estava fazendo.
...
Com o passar das horas, a tarde
caiu, trazendo consigo a noite. Era quase dezenove horas quando o grupo
resolveu se encontrar no hall de competições. O local estava extremamente
enfeitado, e apenas mediante um ingresso já comprado pelo grupo é que puderam
acessar o local. Havia um aglomerado de pessoas em volta da construção,
enquanto alguns carros de marcas refinadas vez ou outra estacionavam trazendo
pessoas supostamente importantes.
Todos se surpreenderam com a
organização do evento. Havia muitos seguranças, e diversos funcionários
indicando onde as pessoas do público deveriam ir. Nas paredes da entrada e
corredores que levavam às arquibancadas havia vários pôsteres de competições
passadas. Serena precisou ir a um caminho diferente dos demais, chegando ao
camarim. Ainda que nenhum dos outros quatro estivesse plenamente confortável,
Charlie e Mikala pareciam principalmente incomodados.
Era
muito comum ver aquele tipo de evento em Lumiose. Não que eu pudesse entrar, é
claro, mas eu sempre via as pessoas comentando e indo assistir, e achava uma
baboseira. Nada além de uma grande apresentação feita para gerar reação do
público em cima de pessoas que ficavam cada vez mais ricas. Mas, pela Serena,
eu poderia assistir uma vez, embora eu sentisse que não me encaixava em
qualquer parte daquele lugar enorme e movimentado.
A garota dirigiu-se nervosa ao
camarim. Ao adentrar, percebeu quase duas dezenas de moças mais ou menos de sua
idade, todas caminhando apressadas pelas dependências, se maquiando e vestindo
seus trajes de apresentação. A garota, por sorte, havia alugado um vestido para
a noite, vestindo-o então. Era de diversos tons róseos, dos mais escuros até os
mais pálidos, com alguns laços delicados enfeitando o traje, mas sem exageros.
Era uma roupa fina e que combinava muito com a menina, apesar de que ela
sentiu-se estranha ao vesti-lo.
Por mais que tivesse achado o
vestido bonito, fazia tempo que não utilizava algo daquele porte. Quando sentiu
a cintura levemente apertada e a parte da saia caindo-lhe pelas pernas, lembrou-se
da última vez que ficou de vestido assim: em sua casa, em seu aniversário de
quinze anos. A lembrança não a fez se sentir muito bem. Em seguida, ela arrumou
seu penteado e aproveitou um dos espelhos bem iluminados para se maquiar,
quando ouviu alguém gritar da porta:
— Senhoritas, em dez minutos
daremos início!
Uma das meninas soltou um grito à outra:
— Por Arceus! — reclamou. — Minha
maquiagem está boa?
— Está linda, meu bem. — confirmou
a outra. — Meu cabelo está alinhado?
— Nem um fio fora. — assentiu a
primeira.
Naquele momento uma das portas do
vestiário se abriu e as duas não evitaram um olhar de espanto. Uma moça alta
apareceu, utilizando uma peruca de cor platinada, tão reluzente que parecia brilhar. Em seu corpo estava um vestido com certeza incomum, preto e branco que parecia duro, e era difícil deduzir seu material. A maquiagem da garota era tão intensa e pesada que seus
traços eram fortemente destacados. Ela destoava das demais participantes, que
ficaram a encará-la com certa surpresa e desagrado.
— O que foi? Beleza demais para
vocês? — disse ela caminhando em seus sapatos de plataforma que a deixavam
daquele tamanho.
Serena sorriu de canto e voltou a
se preparar, respirando fundo para ficar mais tranquila. Chegava o momento. Do
lado de fora, seus quatro amigos já estavam posicionados em seus respectivos
assentos havia um tempo. Após uma televisão transmitir diversos comerciais, as
luzes se apagaram, e a plateia começou a gritar. No telão, era possível ver
alguns escritos e imagens iluminadas, enquanto uma voz ecoava pelos
alto-falantes.
“Doze
participantes. Doze garotas com um sonho em comum: o trono de Rainha de Kalos. Mas
só uma delas poderá levar a Cyllage
Princess Key. A competidora que se
mostrar mais habilidosa nos dois rounds estará um passo mais próxima da
competição na Master Class!”
Uma música acompanhava cada
palavra, trazendo mais empolgação para o momento. De repente, o tom ficou mais
animado, e um holofote iluminou o centro do palco, metros à frente, permitindo
que se avistasse um homem, que àquela altura parecia pequeniníssimo. O público
vibrou intensamente naquele instante, quando a música cessou.
— Boa noite, Cyllage! Boa noite,
Kalos! — houve um coro de boa noite, e até mesmo Mikala se pegou dizendo
inconscientemente. — Meu nome é Benji Castaldi, mas vocês já me conhecem. Assim
como conhecem nossos três grandes juízes.
Ele apontou para trás, e um outro
holofote, se acendeu em uma moça esguia de cabeços castanhos ondulados,
dispostos em um penteado com coque, usando um vestido azul-esverdeado, como as
águas do oceano em Cyllage. Todos aplaudiram e gritaram empolgados.
— Virginie Efira! Como você está
nessa bela noite? — perguntou o apresentador.
— Ansiosa, Benji! — disse ela com
classe. — Quero ver o que nossas competidoras prepararam para nós hoje.
Uma segunda luz focou em um homem
que veio caminhando pelo lado oposto. Utilizava uma camisa social clara por
baixo de um suéter preto, e tinha cabelos e barba grisalhos, dando-lhe um
aspecto experiente. Ele revelou um grande sorriso.
— Jérôme Anthony, preparado para
uma noite de grandes apresentações? — indagou novamente o apresentador.
— Espero que sejam grandes
apresentações mesmo, Benji. Eu não levantei da cama hoje à toa. — disse ele.
Várias pessoas na plateia riram
naquele momento, de maneira que Charlie olhasse para os lados um tanto confuso.
Não parecia tão engraçado assim.
— Estelle Denis! — anunciou uma
terceira vez. — Você também está com a sensação que hoje será uma apresentação
histórica?
Uma moça de cabelos louros curtos e
lisos bem claros apareceu, por fim, em uma terceira iluminação. Ela tinha um
terninho preto e branco e andava com segurança de si, sobre um salto alto
preto.
— Você diz isso em todo programa, Benji.
— falou, com um falso desdém. — Espero que você esteja certo desta vez.
Mais uma vez a arquibancada caiu em
risadas, fazendo com que o grupo de Charlie e Calem fosse um dos únicos a
permanecerem sérios e sem se divertir da mesma forma. Eles se entreolharam como
se não tivessem entendido a piada, buscando uma explicação, mas as pessoas
simplesmente vibravam a cada palavra dita pelo apresentador e pelos juízes.
Enquanto isso, Serena assistia tudo
do camarim por meio de um televisor, onde as competidoras poderiam conferir em
tempo real tudo que era transmitido. Ela podia ver como o palco parecia
assustador, e como as centenas de poltronas estavam preenchidas. Todos lidavam
tão bem com as câmeras que ela se sentiu até mesmo desconfortável ao pensar que
sequer cogitou a ideia de que teria de se apresentar para tantas pessoas.
— Meu Arceus, estou tão nervosa. —
balbuciou ela.
Flabébé, que jazia sentado no ombro
da menina tocou-a no rosto, como um abraço carinhoso, e a garota retribuiu. Era
bom saber que contava com apoio, ainda que a insegurança tomasse conta de si
mesma. No palco, os juízes já estavam sentados atrás de um balcão colorido,
onde uma pequena tela se colocava a frente de cada um. Benji, o apresentador,
caminhavam freneticamente pelo palco com seu microfone, empolgado:
— Na edição de hoje faremos algo
especial, meus caros espectadores. Está na hora de fazer um round que não vemos
há três anos nas competições! É o round de entrevistas. — ele anunciou.
Uma onda gritos ecoou da plateia, e
as luzes se apagaram para o telão exibisse um esquema básico de como a
competição funcionaria.
— Nossas participantes serão
chamadas uma a uma no palco e deverão mostrar seu melhor lado, seu lado mais
íntimo e original. — explicou ele no fundo. — Aquelas que forem cativantes o
suficiente para nossos juízes, e receberem dois ou mais votos, serão selecionadas
para o próximo round.
Algumas pessoas assoviaram.
— E é claro, o round freestyle que vocês adoram, e que precisa
da contribuição de vocês! As quatro competidoras selecionadas receberão votos
de toda Kalos ao vivo. Você pode votar pelo nosso site, ou pelo aplicativo do Pokémon Showcase!
Naquele momento apareceram alguns
símbolos e endereços eletrônicos na tela e algumas pessoas puxaram aparelhos
tecnológicos. As luzes se acenderam e alguns assovios ecoaram pela arena. Os
juízes aplaudiam, com expressões neutras. O apresentador levantou as mãos,
empolgado, quando uma música começou a tocar:
— Que as entrevistas comecem!
Mais gritos. Por que as pessoas
gritavam tanto? Mikala cutucou Calem um pouco confuso:
— Elas vão ser escolhidas só…
Falando da própria vida? — perguntou.
O rapaz deu uma risadinha e
balançou os ombros. Aparentemente nenhuma ideia era estúpida demais a ponto de
ser descartada. Benji anunciou o nome de alguma das competidoras, e a menina
entrou com uma música diferente da banda, com um holofote a acompanhando.
Naquele momento, porém, era difícil prestar atenção sem pensar que em alguns
minutos Serena estaria em seu lugar.
Mais
uma vez eu estava nervoso por Serena. Não que eu não achasse que ela poderia
passar: ela era com certeza a garota mais cativante de Kalos. Nervoso porque
não queria vê-la sendo julgada por isso, sendo colocada como mais incapaz ou
menos, e eu sabia mais que ninguém como as pessoas fúteis eram capazes de fazer
isso com os outros. Ninguém seria capaz de entender o quão fantástica era
Serena em uma competição de poucas horas.
No camarim, vez ou outra algum
funcionário abria a porta com uma prancheta anunciando a próxima a se colocar
próxima ao palco. Serena permanecia junto de seu Flabébé, assistindo a cada
segundo, mas sentia um frio enorme na barriga a cada instante que passava. Para
se distrair, virou ligeiramente a cabeça, ouvindo um trio de meninas
conversando em um dos cantos da sala.
— Ai, nem fale, meu bem. — dizia
uma, apontando para a colega à frente. — Mas eu adorei, acho que combina
perfeitamente com seu estilo e vai fazer sucesso.
— Com certeza. — concordou uma
terceira.
— Ai, obrigada, meninas. —
agradeceu a segunda, em seguida sendo interrompida por um dos encarregados que
chamou por seu nome. — Opa, parece que sou eu agora. Até daqui a pouco. —
falou, com os dedos cruzados.
— Até, linda. — uma delas acenou,
simpática, enquanto via a porta se fechar com a saída da companheira. Em
seguida seu tom mudou completamente. — Você ouviu isso?
— Ela é ridícula, e quer combinar
Pokémons que não tem nada a ver. — concordou a outra, indignada. — Ainda bem
que nem deve passar para a próxima fase.
As duas soltaram uma gargalhada, e
Serena abraçou-se mais forte de seu Pokémon. Ficou um tanto constrangida de
nervosa. As opiniões mudaram tão rápido quando a pessoa não estava mais
presente. Por que isso lhe parecia tão familiar?
No palco, uma a uma as competidoras
eram chamadas. Benji fazia uma sequência de perguntas, vez ou outra
influenciadas pelos juízes, e todas as participantes buscavam responder da
maneira mais espontânea possível, mostrando seu lado mais agradável. Os juízes
então davam sua resposta final, e a tela que ficava na frente de cada uma no
balcão piscava com um xis ou uma bolinha, indicando o voto. Várias moças foram
eliminadas, e algumas pareciam seriamente engolir o choro. Era um bizarro
concurso de simpatia.
Com o anúncio da sexta competidora,
Serena percebeu que entrava no palco a mesma garota que utilizou um vestido peculiar
e recebeu um julgamento das demais. As pessoas na plateia e mesmo os juízes
esboçaram a mesma surpresa de quando a menina apareceu no camarim. Benji fez
uma expressão caricata, recebendo uma série de risadas, e a moça apenas sorriu,
com as mãos na cintura, confortavelmente sobre os holofotes.
— Temos aí um modelito bem básico,
não é? — disse Benji, sendo seguido de uma sequência de risos, inclusive da
própria competidora.
— Se não for para polemizar eu nem
saio de casa. — retorquiu a outra, jogando uma mecha de cabelo para trás e
recebendo uma série de assovios e gritos positivos.
O apresentador assentiu com a
cabeça, convencido.
— Ga Ga, nossa querida competidora,
já tive o prazer de presenteá-la com uma Princess
Key esse ano! — comentou ele. — Acha que está pronta para receber sua
segunda?
— Pergunte isso aos meus fãs, Benji.
— ela tirou uma das mãos da cintura e balançou. — São eles que votam. Mas é
claro que prometo dar meu melhor por eles.
Mais uma sequência de gritos.
Serena ficou ligeiramente intimidada. Ga Ga simplesmente dominava o palco, não
parecia se intimidar pelos juízes e nem pelo público, como se trouxesse todas
as respostas na ponta da língua. Sua roupa, gestos, voz, tudo parecia meticulosamente
calculado para que nada saísse errado, e ao mesmo tempo ela se mostrava
espontânea e original. Como competir com isso?
— Eu gostaria de saber qual é o
critério que você utiliza para criar seu estilo. — uma das juízas, Virginie,
indagou.
— Meu critério sou eu, o que eu
quero usar, o que eu quero transmitir. Eu visto o que eu me sinto à vontade
para vestir. — respondeu ela, recebendo um aceno positivo.
— Ouvi dizer que você está também
na carreira de treinadora. — comentou Jérôme, balançando um dedo. — Não acha
muito difícil estar se dedicando a duas carreiras diferentes?
Ela bateu os dedos no microfone e
deu de ombros.
— De jeito nenhum, as duas se
completam. Eu posso vir aqui, arrasar na passarela, fazer umas explosões de
brilho… E ainda vencer a Liga. Meus Pokémons estão prontos para isso. — ela
sorriu, recebendo gritos de “uau”.
— Ga Ga. — Estelle interveio,
direta. — Se sua maior adversária entrar por essa porta agora, o que você
faria?
— Eu diria “tirem esse espelho
daí”, porque acho que nossos maiores adversários somos nós mesmos, sabe? Mas
felizmente estou aprendendo a me controlar. — ela deu uma risada.
A plateia vibrou fortemente, e os
juízes ficaram praticamente sem qualquer reação negativa.
— Uau, essa foi exemplar! —
comentou Benji. —Vamos ver se os juízes acham que você tem o que é preciso para
o próximo round.
O rosto de Estelle apareceu no
telão.
— Eu já te disse isso em outras
competições, garota. Você é autêntica, é ousada, é incisiva e imparável. É
disso que Kalos precisa em uma Rainha, uma subversão dessas. — ela apontou o
dedo, pressionando um botão que fez um círculo verde aparecer no balcão dos
jurados. — Meu voto é sim. Você é uma das minhas novatas favoritas.
Todos aplaudiram.
— Não tenho por que votar não. —
falou Jérôme. — Olho para você e vejo alguém inspiradora, alguém destemida. Com
certeza sim.
Voto positivo.
— Temos uma linha muito parecida de
Rainhas, e seria incrível mesmo ver alguém assim, tão desafiadora no trono. —
sorriu Virginie. — Meu voto é sim.
Com três círculos verdes, a competidora
estava claramente classificada. Uma onda de aplausos, gritos e elogios surgiu
da plateia, inclusive com algumas pessoas se levantando. O grupo de Charlie
ficou um pouco desconfortável por não compartilharem da mesma empolgação
— Com unanimidade, Ga Ga está
cotada para o próximo round! — anunciou Benji, virando-se para a garota. — Nos
vemos mais tarde!
Ga Ga mandou um beijo para a câmera
e começou a se retirar do palco, caminhando com maestria, como se estivesse
numa passarela, e tanto seu vestido como seu salto não pareciam tão incômodos da
forma com que ela andava sem problemas. Serena ficou um pouco paralisada, mas
seu coração voltou a bater com força quando alguém abriu a porta do camarim e
chamou por “Serena Windsor”.
Era a hora.
A garota seguiu o funcionário, que
agia com tanta naturalidade que nem parecia guiá-la para algo tão grandioso
como ela sentia. Passou por alguns corredores escuros, e ficou parada por trás
de algumas cortinas. De lá era possível ver o palco e um enorme vácuo escuro,
onde a plateia estava sentada. A garota tremia ligeiramente, engolindo em seco.
— Agora vamos para uma competidora
especial. — anunciou Benji. — Pela primeira vez fazendo uma performance, ela
está aqui. E vocês possivelmente já a conhecem. Sereeena Windsor!
A menina recebeu um microfone e
começou a caminhar em direção ao palco, devagar, tomando cuidado para não cair.
Um passo de cada vez. Por mais incrível que parecesse, e para a surpresa de
Calem e Charlie, inúmeras pessoas se levantaram e começaram a gritar de
animação. Isso não havia acontecido com todas as demais participantes. A garota
foi até o apresentador, ficando ligeiramente distante, fora do foco de luz.
— Por que estão gritando? — alguém
atrás de Ashley indagou. — Você sabe quem é?
— Parece que ela é famosa. —
respondeu alguém do lado.
Serena tentava controlar o
nervosismo, depositando o peso um pouco em uma perna, um pouco em outra. Benji
colocou a mão na cintura.
— Aqui na frente, querida. Não
finja que não está acostumada com os holofotes. E você é linda, não precisa se
esconder. — ele puxou ela pela mão para um holofote, recebendo risos. — Vem,
aqui na luz.
Quando ela chegou à luz, era
difícil ver qualquer coisa na plateia. Era uma sobrecarga de informações, de
sons, de pessoas, de acontecimentos. Luzes, câmeras por todos os lados, todos
olhavam para ela. Todos aguardavam por uma palavra. Cada milésimo de segundo
parecia uma eternidade em que ela fazia papel de boba. Os jurados estavam ali,
de frente para ela, e todos eles eram pessoas reais e normais. Com tantas
coisas acontecendo, a menina ficou em silêncio por mais tempo que gostaria,
confusa, sem saber para onde olhar ou como lidar com tantas energias no mesmo
espaço.
— Serena. — chamou Benji.
Ela saiu do transe.
— Oi? — ela respondeu, puxando o
microfone.
Inevitavelmente houve um coro de
“oi” pelo qual ela não estava esperando.
— A que devemos a honra de sua
presença? — perguntou o apresentador.
— Hã… Eu… — ela escolheu as
palavras, mas era como se um branco percorresse sua mente naquele exato
momento. — Estava com vontade de participar?
Benji riu, assim como alguns dos
presentes.
— Ela não é uma graça? — falou ele.
— Quem é o seu mentor? Tenho certeza que ele vai ficar muito popular a partir
de hoje.
A garota ficou um pouco
desconfortável.
— Eu não tenho…
Benji soltou uma expressão de
susto, bem como várias outras pessoas, o que fez a garota se questionar se
disse algo errado. Ele continuou.
— Eu não posso com essa menina,
gente, ela é muito fofa. — fez um gesto a ela. — Agora, precisamos conversar
sério, mocinha. — disse, mudando o tom de voz para falsamente repressivo, Você anda
aparecendo por aí nas notícias fazendo coisas bem feias.
A garota sentiu um frio maior em
sua barriga, ficando fortemente desconfortável. Ela segurou o microfone com força.
— Ah... É? — uma sequência de
murmúrios foram as únicas coisas que ela conseguiu pronunciar, ainda que
tentasse realmente formar uma frase mais complexa.
Em seguida apareceu uma notícia no
telão, com uma foto de Serena segurando seu Goomy, na saída do aquário de
Ambrette, junto de vários policiais, no momento exato em que esperava por Calem
e Charlie para a auxiliarem.
— Roubando um Pokémon, Serena? —
indagou o apresentador alto, dando destaque para a manchete.
Houve uma sequência de risos enorme
da plateia, e a garota ficou sem saber o que dizer. Por mais que tentasse,
sentia sua garganta se fechar antes de soltar as palavras e permitir que elas
ecoassem. O silêncio novamente foi maior do que ela gostaria, de maneira que
sentisse os olhares se depositando nela, aguardando por algo
— O que você tem a dizer sobre
isso? — provocou Benji, com um sorrisinho.
— Eu… Hã… — ela colocou uma mecha de
cabelo rebelde atrás da orelha, nervosa. — Quis salvar ele, ele estava bem
infeliz lá e eu só queria ajudar.
Naquele momento ela ouviu um coral
de “awn”, e sentiu ligeiramente que fez certo, mesmo que tivesse apenas falado
a verdade.
— Linda e solidária, é disso que
Kalos precisa! — falou o apresentador, percebendo sons de consonância. — E você
está aqui para honrar o nome da sua família nas competições?
— Não, eu só queria me divertir
mesmo. — ela respondeu mais ligeiramente, mas percebeu que instaurou-se um
silêncio, como se tivesse dado uma resposta curta e simples demais. O apresentador
tentou puxar mais assunto ao ver que era apenas aquilo.
— Agora me explique então essa,
Serena. — disse, apontando novamente para o telão. — Quem é o boy misterioso na
foto? Queremos saber nomes!!
O coração de Serena disparou
naquele momento. Aquela era uma foto da garota abraçada com Charlie na beira da
praia, do dia anterior. Era bizarro porque tratava-se apenas de um momento de
conciliação, mas a captura da imagem era tão dramática naquela cena que parecia
um minuto final de filme romântico, no auge da história. Ela conseguiu ouvir de
longe diversas pessoas cochichando.
— Sou eu? — murmurou Charlie.
— Como vocês conseguiram isso? —
Serena deixou escapar.
— Vamos lá, garota, você é quase
uma celebridade! — Benji cutucou ela com o cotovelo, provocativo.
— É um amigo meu, só isso. — explicou
ela de prontidão.
— Tudo bem, vamos parar, coitada
dela. Chega de fotos! — balançou o apresentador, e o telão voltou para a imagem
inicial do torneio. Ele voltou ao tom sério. — Serena. — pausa. — O que você
tem a oferecer para nossa competição para ser selecionada para a próxima fase?
A menina respirou fundo. Uma
pergunta finalmente que ela poderia responder sem constrangimentos ou
confusões:
— Eu prometo que eu e meus Pokémons
daremos o melhor e faremos a melhor apresentação que pudermos.
Houve uma série de aplausos, e ela
abriu um sorriso discreto, menos verdadeiro do que ela gostaria. Não se sentia
exatamente confiante, mas o apresentador também fez um gesto com as mãos, de
elogio.
— Palmas, palmas. — virou-se para
trás. — Agora vamos ouvir o que nossos juízes têm a dizer sobre.
O foco foi para Jérôme.
— Eu gostei de você. — falou o
homem. — Simpática, caridosa, afável… E vejo que as pessoas gostam disso. — ele
fez uma pausa até pressionar um botão. — Meu voto é sim.
Quando viu o círculo verde, Serena
sentiu uma grande felicidade e um imenso alívio em seu peito, sem exatamente
saber o porquê.
— E você, Estelle?
— Não me engana, Benji. — disse a
moça, recebendo alguns “oh” de surpresa e impacto.
— Como assim, minha querida Estelle?
— indagou ele perplexo.
— Essa coisinha de ser fofa, e tudo
mais, não me engana, garota, essa personagem já está batida. — falou a juíza de
maneira simples, fazendo um gesto de repulsa com a mão. — Eu quero atitude
nesse programa. Sinto muito, meu bem, mas o meu voto é não. — ela pressionou um
botão e um som negativo ecoou, ao aparecer o xis vermelho na telinha. — Falta
sal.
Houve um momento de mistério e
silêncio.
— E isso é o que eu chamo de
atitude! — brincou Benji. —Virginie, o futuro da senhorita Windsor está em suas
mãos.
— Não faça isso comigo, Benji. —
disse a juíza escondendo-se entre suas mãos.
Após mais risadas, tocou uma música
de fundo com um tom de mistério e um rufar de tambores.
— Eu discordo, não vejo apenas sal
em você, mas principalmente açúcar. — comentou a mulher, sorrindo. — Achei você
um amor, e quero te ver competindo. Por isso eu votarei sim. — vários gritos. —
Mas… Ei, me ouçam. — ela pediu silêncio e fez uma pausa. — Mas vai precisar de
mais que um belo sorriso e uma voz doce para ser a Rainha de Kalos.
Ela abaixou o dedo e pressionou um
botão, fazendo um círculo verde aparecer na tela do balcão e indicar o voto
positivo. Serena agradeceu mentalmente, mas não sabia exatamente o porquê.
Continuar naquela competição era um grande alívio ou um medo do que viria no
próximo passo? Ela não sabia bem.
— Serena Windsor está na próxima
etapa! — anunciou Benji, empolgado.
Após ser ovacionada mais uma vez, a
menina deu um tchau para a plateia com o melhor sorriso que foi capaz de
mostrar. Em seguida caminhou devagar por onde entrou, sem exibir qualquer
hesitação. Ao chegar atrás das cortinas, sentiu um peso em suas costas e saiu
de sua postura impecável, sentindo vontade de sentar ali mesmo. Era uma
sensação boa mas ao mesmo tempo terrível.
— O que acabou de acontecer? —
indagou Charlie, confuso.
— Depois vocês perguntam por que eu
não quero participar dessas coisas. — murmurou Ashley.
— A Serena deve estar se sentindo
horrível. — comentou Mikala, chateado.
— Eu estou com medo é das fotos que
eles têm de nós. — observou Calem. — Será que elas são bem populares?
— É bem possível. — assentiu a
ruiva.
Quando Serena retornou ao camarim,
recebeu uma série de olhares terríveis, como se tivesse acabado de cometer um
crime. Ouviu um ou outro parabéns, mas tinha medo de tomá-los como sinceros. O
sentimento era que os olhos das meninas ao redor a julgavam ou desprezavam, e
não havia qualquer lugar onde se segurar naquele momento.
— E terminam as entrevistas. —
dizia Benji pelo um televisor. — Sabemos agora quem serão as quatro
participantes que tem potencial para receber a Princess Key! Após os comerciais, vamos dar início à etapa Freestyle!
Começaram a aparecer diversas
propagandas, e as portas do camarim foram abertas para que algumas competidoras
desclassificadas se retirassem após tirarem o figurino. Havia algumas chorando
e outras esbravejando, mas Serena tentou segurar a vontade de chorar que tinha
em seu peito. A menina resolveu ir ao banheiro, quando ouviu um som esquisito.
Após abrir uma porta entreaberta,
levou um choque ao ver uma menina sentada no chão, enquanto tentava regurgitar,
a pele branca como um papel e os braços tão magros que pareciam poder se
quebrar a qualquer instante. A menina lançou um olhar nervoso para a loira e tentou bater a porta.
— Fecha essa porta! — gritou com as
forças que encontrou.
— Vá embora. — ela empurrou a porta
para que se fechasse.
— Eu vou chamar ajuda. — disse a
menina, sem muita alternativa.
Apesar de ouvir protestos, Serena
continuou correndo atrás de alguém. Não sabia o porquê, mas não conseguia
simplesmente ficar parada e permitir que algo acontecesse, ignorando mais
alguma coisa naquele espaço. Talvez precisasse urgentemente encontrar alguém
para ajudar a si mesma primeiramente, alguém em que pudesse encontrar apoio
naquele momento. Se algum de seus amigos pelo menos estivesse lá…
Adentrando um espaço que talvez não
estivesse autorizada a visitar, a menina viu uma porta entreaberta. Quando
notou as vozes, elas pareciam as dos juízes. Ela ficou imóvel atrás da parede.
— Óbvio que eu votei não. —
murmurava Estelle. — Se eu votasse “sim” iria parecer que estamos pegando leve,
porque a apresentação dela foi terrível. Ela não tem carisma para continuar.
— Você sabe o salto que a audiência
deu depois que ela entrou? — interveio Benji, cochichando. — Todo mundo quer
ver a filha do milionário. Ela tinha que estar na próxima fase. Dois votos “sim”
e um “não” estão de bom tamanho. Mas vocês deveriam ter sido mais ríspidos.
Ela tentou espiar pelo vão da
porta, e naquele momento conseguiu ver apenas Jérôme sentado em uma poltrona. O
juiz virou-se e os olhos se encontraram com os da menina naquele instante, mas
tudo que ela pode fazer foi correr de volta para o camarim, sem escutar mais
nada que era dito naquela pequena sala.
...
— Bem-vindos de volta à competição!
— dizia Benji. — Vamos começar agora a etapa Freestyle. Nossas queridas participantes devem mostrar uma
performance que valorize ao máximo a si mesmas e seus Pokémons. Vamos ver o que
elas têm preparado.
A primeira competidora a entrar foi
Ga Ga. A garota apareceu desfilando com confiança e puxou duas de suas
Pokébolas, ambas enfeitadas com cristais e lantejoulas. Ela disparou as esferas
em um movimento sincronizado para cima, uma em cada mão:
— Furfrou e Swirlix, é a hora de
vocês! — bradou.
Após um brilho intenso, cada uma
delas revelou uma criatura diferente. A primeira já era uma figura conhecida do
grupo, um Furfrou, mas este não com a pelugem de sempre: Estava perfeitamente
aparada, de maneira que seus pelos parecessem uma vestimenta e um chapéu, enquanto
o segundo Pokémon parecia uma nuvem cor de rosa, quase como um algodão doce.
— Thunder Wave. — instruiu a moça. — Sweet Scent e Cotton Spore!
Swirlix se concentrou por um
momento, liberando uma pequena nuvem de energia cor de rosa à sua volta. Logo
em seguida, pareceu ampliar de tamanho, quando a quantidade de pelos em seu
corpo aumento em volume. O Pokémon soltou um grito, e vários tufos de pelo
saíram de seu corpo, sendo disparados como bolas de algodão. O Furfrou
iluminou-se em uma aura elétrica, e em seguida disparou uma onda de raios que
atingiu os próprios tufos, disparando-os contra a plateia e transformando-os em
pedaços menores. A eletricidade fazia as bolinhas de algodão expandirem, e
todas possuíam um cheiro doce do Sweet
Scent, parecendo algodão-doce. As pessoas ficaram admiradas ao conseguirem
tocar as pequenas bolinhas.
— Terminemos com o Dark Pulse e o Dazzling Gleam!
O Furfrou disparou uma grande onda
de energia escura à sua volta, parecendo brilhar em ligeiros tons de roxo.
Apesar de começar como algo simples, a energia se expandiu o suficiente para
atingir grande parte do palco e fazer os holofotes terem sua claridade drenada,
deixando o estádio em uma escuridão total. Após alguns momentos, pôde-se ver um
único foco de luz extremamente brilhante se abrir, provindo de Swirlix, dando
destaque para Ga Ga e seus dois Pokémons no palco, em uma pose épica.
A arena foi à loucura, vibrando e
ovacionando a treinadora. Serena não prestou atenção no que os juízes disseram,
apesar de ter certeza de que elogiariam extremamente Ga Ga. E com razão. A
apresentação era praticamente impecável, e tanto ela quanto seus Pokémons
pareciam dominar aquele espaço tão intimidador.
Após duas outras competidoras,
Serena preparou-se para sua vez. Hora de voltar ao palco. Ela respirou fundo
para não cair e para conquistar forças. Desta vez sabia o que fazer, mas não
tinha certeza se encontraria coragem para ser a atração principal. Ou parte
dela. A garota segurou suas duas Pokébolas com força e caminhou para o palco,
recebendo uma série de aplausos.
— Vamos!
Ela estendeu as duas esferas. De
uma delas saiu seu Flabébé, flutuando pelo palco com sua clássica flor, e da
outra saiu Smeargle, um pouco desengonçado e envergonhado com o público,
balançando sua cauda.
— Vamos fazer conforme combinado,
certo? — pediu a menina. — Use o Lucky
Chant, Flabébé, e Smeargle o Sketch!
Smeargle começou a correr pelo
palco, parecendo pintar o chão. Contudo, era impossível ver qualquer coisa das
arquibancadas, uma vez que a tinta usada era quase da cor do palco. Enquanto
isso, Flabébé e Serena faziam uma coreografia ensaiada simples e delicada, sincronizados,
o pequeno Pokémon fada brincando no ar, brilhando seu corpo com o ataque
utilizado.
Uma música tocava ao fundo, do tipo
que Serena ouvia para dançar em sua mansão. Ela já havia feito aulas de dança
devido à sua família, e por sorte se lembrava de alguns movimentos para ensinar
a seu Pokémon. Contudo, eram passos relativamente simples, girando e passando
as mãos em torno do corpo.
— Razor Leaf e Fairy Wind!
— pediu a menina.
Smeargle parou de pintar e voltou
para o centro do palco com sua treinadora. Flabébé invocou uma onda de folhas
com seus poderes da natureza, e em seguida criou um pequeno redemoinho
extremamente brilhante, que auxiliou a dispersar as folhagens em volta. Elas
caíram e grudaram onde a tinta havia sido colocada pelo parceiro, e brilhavam
com o golpe do tipo fada. Era possível ver agora o desenho esboçado por
Smeargle: uma grande face sorridente do próprio Pokémon pintor feita de folhas,
reluzindo à luz e ocupando quase todo o palco, tendo o trio no meio. Os três
fizeram uma pose ensaiada e a música parou.
Muitas pessoas se levantaram das
cadeiras para aplaudir, empolgadas com a demonstração. A menina sentiu seu
coração pulando para fora do peito, mas respirou mais aliviada. Não importava o
que acontecesse, teria terminado, e ela podia se sentir mais tranquila. Porém,
sentiu como se aquilo valesse a pena. Que sentimento era aquele? Ver as pessoas
ovacionando, gritando seu nome, assoviando. Ela se sentia especial e importante
naquele palco.
— Temos aí a primeira apresentação
da filha de Stevan Windsor! — anunciou Benji. — O que vocês tem a dizer,
juízes?
— Eu esperava mais, até para uma Rookie Class, querida. — Estelle deu de
ombros, recebendo risos. — Eu não gostei. Mas não sou eu quem tem que gostar,
certo?
— Eu achei simples, achei bem
discreta. — argumentou Virginie. — Mas isso não é ruim, ela foi executada nos
conformes.
— Exatamente. — concordou Jérôme. —
Não notei falhas graves em nada, justamente porque você não se arriscou. Uma
boa apresentação. Nem ruim, nem ótima. Boa.
A garota balançou a cabeça tentando
não se afetar pelas palavras e se despediu uma última vez com seus Pokémon,
caminhando para fora do palco. Agora poderia ficar aliviada que o pior momento
havia passado. Ela abraçou Smeargle e Flabébé e deu uma última espiada lá fora.
O apresentador voltou ao centro das atenções.
— Muito bem, agora teremos o
momento mais aguardado do programa. Os cinco minutos maaais longos da semana de
vocês! A hora da votação!! — ele gritou, e várias pessoas começaram a pegar
aparelhos digitais. — Utilizem nosso aplicativo ou entrem em nosso site e votem
na candidata favorita de vocês. A vencedora será anunciada após os comerciais!
A garota agachou para ficar na
altura de seus parceiros. Após várias carícias e agradecimentos, ela os encarou
nos olhos:
— Pessoal, vocês foram ótimos. Mas
não esperemos muito. Nós viemos para nos divertir. — ela sorriu. — Tem pessoas
aqui que treinam intensamente todos os dias para isso, e merecem mais essa
vitória que nós. Então aconteça o que acontecer, fizemos um bom trabalho,
certo? — ela os olhou.
Os dois concordaram, embora ainda
estivessem um pouco agitados. A própria menina também estava, mas não podia
negar que as outras apresentações foram bem planejadas e perfeitamente
executadas, ao menos a seu ver. Ela retornou as duas criaturas para suas
Pokébolas e se dirigiu junto das três outras competidoras para o palco. Todas
deveriam aguardar os resultados da contagem oficial.
Quando as luzes se acenderam, as
quatro estavam lado a lado no palco, próximas a Benji, que caminhava animado:
— Voltamos agora dos comerciais, e
está na hora do momento mais aguardado. — ele fez um mistério. A hora dos
resultados!
Após algum tempo de suspense, com
uma música intensa e um rufar de tambores, Serena acreditou que talvez não sobrevivesse
a tanta expectativa. Os segundos pareciam horas, e de repente o telão colocou
fotos das quatro Performers. Um gráfico apareceu ao lado de cada uma, e
vagarosamente começaram a se colorir conforme os resultados eram recebidos.
— E a vencedora da competição, que
irá levar para casa a Cyllage Princess
Key é…
A garota tremia. Por que se sentia
assim? Por que tanto mistério? Mesmo que não fosse ganhar, não aguentava aquela
espera. De repente, os gráficos começaram a destoar conforme a diferença de
votos, e sua dúvida foi sanada apenas com o grito de Benji.
— Serena Windsor, com 43% dos
votos, um resultado esmagador! — anunciou, e vários confetes explodiram no
palco.
A garota por um momento ficou
pasma. Se ela sequer esperava vencer, quem diria por uma quantidade de votos
tão alta. As demais concorrentes aplaudiram, com um sorriso. Ga Ga usava óculos
escuros, então era difícil avaliar sua expressão, mas ela também batia palmas.
Uma pequena criatura apareceu flutuando, carregando um molho de chaves. Uma
delas foi até a garota, e ela segurou aquele objeto com toda a sutileza do
mundo. Era um prêmio delicado, e extremamente bonito. Ela sorriu.
— O que tem a dizer com essa
vitória, minha querida? — perguntou Benji, oferecendo-lhe o microfone.
— Eu… Eu não esperava por isso,
queria agradecer aos meus Pokémons que fizeram o trabalho… — ela tentava se
livrar do branco. Não havia preparado agradecimentos. — E aos meus amigos, e…
— Quer mandar um beijo para a
família? — interrompeu ele.
Serena respirou fundo. Sequer tinha
pensado que sua família poderia estar vendo aquilo. Por um pequeno momento a
ideia de que seu pai estivesse assistindo à sua vitória pareceu provocativa e
agradável. Ela deu um pequeno sorriso.
— Ah, claro. — e simulou um beijo
para as câmeras.
— Espero que tenham nos acompanhado
até aqui. — disse Benji. — Semana que vem estaremos de volta com mais um
Pokémon Showcase de tirar o fôlego em Snowbelle! Comprem seus ingressos e não
se esqueçam de continuar mostrando o seu melhor! — ele anunciou, e as luzes das
arquibancadas se acenderam, com as saídas sendo abertas.
...
Serena preparava-se para ir embora,
agora já em suas roupas de sempre. Ela encarava a pequena chave sem saber
exatamente o que pensar dela. Caminhando rumo à saída, não conseguiu evitar
escutar uma gritaria, do que pareciam as finalistas que a aplaudiram no palco.
— Eu não acredito que aquela
imbecil ganhou!! — dizia uma, com voz de choro. — Você viu a droga de
apresentação que ela fez?
— Foi ridículo. Não tinha nada
demais. — concordou a outra. — Ela só ganhou porque as pessoas gostam dela.
— Ela no mínimo deve ter comprado a
vitória. Tomara que seja pega e nunca mais participe de um Showcase na vida
dela. — reclamou.
A garota respirou fundo e sentiu um
imenso peso em sua mente. Olhou mais uma vez para a chave e se questionou se
aquilo realmente teria valido a pena. Guardou na sua mochila e caminhou o mais
natural possível, percebendo seus amigos a aguardando na saída. Finalmente
poderia vê-los de novo.
— Eu não acredito que você ganhou!
— comemorou Mikala.
— Estamos falando com a futura
Rainha de Kalos? — brincou Calem.
— Você foi ótima, princesa. —
concordou Charlie, aplaudindo.
Ela deu um sorriso sem-graça.
— Obrigado por terem vindo, gente.
E foi caminhando na frente.
Por mais que tentassem puxar
assunto, Serena era sempre direta nas respostas, mesmo que fosse sem querer.
Parecia tentar evitar um desconforto, e sempre que precisava opinar sobre algo,
tentava se esquivar. Quando perceberam, os quatro tentaram mudar de assunto. Ao
chegarem no hotel, Serena foi em seu quarto e ficou fechada lá por tempo
suficiente para que os outros se preocupassem. À certa altura todos faziam uma
roda na porta, se perguntando o que fazer.
Eu
tinha uma má impressão sobre aquele lugar, mas minhas experiências sempre foram
mais desagradáveis, e não queria que isso afetasse a Serena. Era ridículo como
expunham as pessoas daquela forma, tentando se derrubarem para conquistar um
título. Todo o brilho da competição era bonitinho, mas o que os outros
realmente queriam ver era intriga e polêmica. E eu realmente não sabia como
engolir esse tipo de futilidade.
— Eu sabia que era uma má ideia. —
comentou Calem.
— Você sempre pensa que tudo é uma
má ideia. — resmungou Charlie, recebendo uma falsa risada.
— Parecia tão legal, se eu soubesse
que iria ser assim… — murmurou Mikala, chateado.
— E você sempre acha que tudo vai
ser legal. — adicionou Charlie.
— Por que então ao invés de apontar
o dedo você não faz alguma coisa? — sugeriu Calem, começando uma briga.
Em meio à discussão dos garotos,
Ashley, comentou, baixinho:
— Eu falo com ela.
De repente instaurou-se um
silêncio. Todos se entreolharam e em seguida começaram a gargalhar.
— O que é? — perguntou a ruiva
ofendida.
— É só que você é a mais insensível
de todos nós. — comentou Charlie. — Até mais que o Calem.
— Eu acho que é melhor eu falar com
ela. — disse Mikala.
— Eu sou primo dela e a conheço há
mais tempo. — interveio Calem. — Eu falo.
— Gente, sério, deixa que eu falo.
— insistiu a menina.
— Você vai deixar ela pior. —
opinou Charlie, franzindo as sobrancelhas.
— Essa é a imagem que vocês têm de
mim? — perguntou a garota, incomodada. — Que horror. Me deem cinco minutos,
está bem?
Apesar de não concordarem, todos
respiraram fundo e tentaram aceitar. A garota entrou dentro do quarto com seu
típico laptop debaixo do braço, agindo com mais naturalidade como era possível.
Serena estava deitada em sua cama, abraçando um pequeno bichinho de pelúcia.
Não era possível ver seu rosto daquele ângulo.
— Eles pediram para você falar
comigo? — perguntou a menina, e sua voz estava fraca, como quem acabara de
chorar.
— Não, eu só vim pegar meu
carregador. — respondeu Ashley, pegando um pequeno cabo na mochila, e após uma
pausa continuou. —Você não parece muito feliz como a vencedora da maior
competição de Kalos.
Serena respirou fundo, e Ashley
pensou se o comentário fora muito ruim. Porém, a loira se sentou na cama, com
os olhos ainda vermelhos e inchados, evitando fazer contato visual.
— Eu sei que eu não deveria ficar
assim, porque eu ganhei, mas foi terrível! — reclamou ela, voltando a derramar
algumas lágrimas. — O jeito que eles agem, é tipo…
— A sua família. — comentou Ashley,
se aproximando dela. — Ou igual nos eventos que você ia quando criança.
Serena fez que sim com a cabeça.
— Como você sabe?
— Não é difícil imaginar. — sorriu
a outra, sentando-se na cama junto de Serena.
A garota tomou fôlego para
continuar falando.
— E eu não merecia ter ganhado, eu
entrei só para me divertir. Tinha aquelas meninas supertalentosas, e a Ga Ga é
fantástica… — ela listava. — Eles planejaram me passar para o segundo round!
— Claro que não, você passou porque
gostaram de você. — rebateu a ruiva.
— Você não acredita nisso. — cortou
Serena, sinceramente. — E eu ouvi eles conversando no camarim.
Ashley ficou sem palavras naquele
momento, e viu que Serena voltaria a chorar.
— Ei, olhe para mim. — ela puxou o
rosto da outra. — Eu sei que parece uma droga… Não que já tenham sido melhores
antes, mas hoje a competição é só uma desculpa para colocar várias meninas se
estapeando por uma coroa. — disse, direta.
A garota concordou.
— Eu sei. E todos são tão falsos,
tentando passar a perna um no outro… — ela se lembrava de todas as intrigas que
viu.
— Eles ganham audiência assim. —
falou Ashley, tomando sua atenção. — Fazendo vocês brigarem para ver quem é a
mais bonita, ou que dança melhor, ou mais inteligente. Ao invés de tentarem
criar uma competição saudável onde todas mostrem suas habilidades com seus Pokémon.
Ashley segurou a mão da garota, e
tinha um tom sério em seus olhos acinzentados.
— Serena, não caia nessa. Você é
incrível, e fez tudo de coração. — ela revelou um sorriso bem fino. — Não pense
que você é menos só porque a onda deles é fazer vocês se odiarem num programa
fajuto. — ela puxou seu notebook, mais animada.
A loira aguardou por um momento
para ver qual exatamente era o ponto da amiga, embora suas palavras
reverberassem em sua mente, realmente a atingindo. Ela sabia que Ashley não era
do tipo que agradava ninguém, então estaria sendo a mais sincera possível. A
ruiva, após digitar algumas coisas, entregou-lhe o computador.
— O que é isso? — perguntou Serena.
— É uma página no Pokémon Global
Link dedicada a você. — ela pontou para a tela. — No tópico tem várias pessoas
elogiando você e sua performance. Olha só.
Clique para ampliar
— Isso é de verdade? — perguntou
Serena, abrindo um pequeno sorriso.
— Sim, é de verdade, e tem uma
centena de comentários. — ela foi abaixando a página. — Esse outro tópico aqui
é de pessoas de Unova, da região que eu vim, que assistiram e torceram por
você. — ela mostrou.
Serena ficou um pouco incrédula,
soltando uma risada.
— Eu sei que tem pessoas que não
concordaram e não gostaram… Mas isso sempre vai existir. E não vai mudar o
resultado da competição. — ela abriu um sorriso dessa vez nítido. — E nem o
fato de que muitas outras pessoas gostam de você.
Serena não sabia o que dizer,
apenas impulsivamente continuou vasculhando os comentários positivos em sua
página. Então ela tinha um grupo de fãs?
— Eu entendo plenamente se você
nunca quiser mais colocar os pés numa competição dessas, porque, né. — a ruiva
deu de ombros. — Mas não se esqueça que você tem várias pessoas torcendo por
você.
Serena devolveu o laptop, sem saber
o que dizer.
— Ashley, muito obrigada!
Antes que a outra pudesse
responder, Serena atirou-se contra ela em um abraço forte e sincero. A ruiva
deu uma risadinha e ficou um pouco sem saber como proceder, abraçando de volta
a princípio mas logo sem saber como continuar. A loira, contudo, permanecia na
mesma posição.
— Imagina… Hm, acho que já está
bom, né… — ela foi indo para trás, mas percebeu que Serena continuava abraçada.
— Tudo bem…