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Notas do Autor - Capítulo 31

ALERTA DE SPOILERS! Antes de ler as notas, leia o capítulo correspondente primeiro!

De volta à nossa aventura!! Já faz um certo tempo, e para nossos personagens também. Algumas semanas se passaram desde o capítulo 30 - praticamente um mês - e bastante coisa aconteceu nesse meio tempo. O intervalo foi suficiente para que certos sentimentos ficassem à flor da pele ~rs.

Espero que se lembrem de como as coisas terminaram na Saga X. Agora voltamos de fato à rotina de nossos personagens e passaremos a acompanhar a jornada como sempre, apesar de todas as transformações que ocorreram ao longo desse tempo. Uma característica marcante dessa temporada e que vocês perceberão é certa distância dos protagonistas entre si. Cada um dos três está lidando com os problemas de uma forma diferente, e acho que ficou nítido hoje como essa perda da sintonia afetou o trio. Isso vai fazer com que todos os três tenham um bom desenvolvimento pessoal ao longo dos capítulos, e não vejo a hora de mostrar pra vocês um pouco mais disso!


Quanto à primeira metade do capítulo, dispenso muito mais comentários: tudo de mais importante está escrito lá e veremos melhor pelos próximos episódios. Estarei, ao longo da semana, atualizando as páginas dos personagens com tudo o que aconteceu ao longo desse tempo. Faz alguns anos que não atualizo essas páginas, então fiquem ligados!


Estarei também respondendo os comentários de vocês assim que puder! A semana de retorno da faculdade drenou meu tempo e minha energia de um jeito que quase achei que não ia conseguir postar o capítulo (já escrito). Agradeço, mesmo assim, por todos vocês que deram um apoio com o retorno da fic. Fico muito feliz de iniciar essa nova etapa. <3 Que venham os Novos Tempos!

Capítulo 31


CAPÍTULO 31
Novos Tempos

Pingos finos caíam do céu cinza, em uma quantidade tão reduzida que deixavam o chão molhado em um delicado pontilhado. O moço ouvia os batuques das gotas ressonando em seu guarda-chuva como uma melodia tranquilizante da natureza naquele dia frio de outono. Um carro de porte intimidador estacionou alguns metros à frente, e bastaram alguns segundos para que alguém uniformizado descesse e abrisse a última porta.
Sua respiração mudou instintivamente quando viu os pés dela tocando o chão de pedra molhado.
O motorista a cobriu com um guarda-chuva para que descesse do carro. Ela já seria suficientemente alta sem os saltos, mas eles a deixavam ainda maior  Os olhos como duas pérolas negras cravaram no rapaz assim que desceu, mas seus grossos lábios desenharam um sorriso aparentemente simpático. Os cabelos perfeitamente enrolados subiam acima dos ombros, tocando a pele escura como a noite de uma maneira singela.
Ela seguiu uma sequência de passos até ele, e o rapaz estendeu o guarda-chuva para que entrasse. Foram alguns segundos de ponderamento enquanto ela fitava seus olhos azuis como o oceano da parte costeira de Kalos.
— Siebold. — disse a moça.
— Sienna. — acompanhou ele.
Ela se despediu do motorista e foi para debaixo do guarda-chuva do outro. Seus olhos não evitaram admirar a fantástica construção que estavam prestes a adentrar. Ela se lembrava daquele lugar perfeitamente. Sentiu um ar frio vindo de dentro, em conjunto aos ecos perdidos que escapavam pelo imenso portão. Quantas memórias cabiam dentro daquele castelo?
Quando a porta se fechou, um silêncio súbito restou dentro do salão. A chuva e o vento de Kalos eram inaudíveis por trás das paredes reforçadas. O lustre imenso que pendia do teto não iluminava tanto quanto deveria, por mais rebusques que tivesse. Ela ainda assim esfregou as palmas das mãos, tentando se afastar do frio costumeiro da região. Seus olhos se encontraram com os do rapaz, que moveu um conjunto de fios do cabelo louro para detrás da orelha. Sorriram levemente, soltando uma risadinha que se perdeu pelos corredores próximos.
— Faz algum tempo. — murmurou ele, indicando o caminho. — Por onde andou?
Sienna suspirou fundo.
— Por aí. — deixou escapar, simplesmente.
Knoc. Knoc. Knoc. Os saltos batiam na pedra a cada passo. Siebold seguia o caminho, e uma tempestade de pensamentos dançava em sua mente – tempestade essa mais forte que a garoa fina do lado de fora. Contudo, quando fitava aqueles olhos escuros sensuais e misteriosos, as palavras pareciam perdidas e tolas demais para serem colocadas para fora. Chegaram juntos após alguns silenciosos momentos a uma salinha.
Sienna admirou aquele espaço. Pequenas dimensões, com uma comprida mesa ao centro. Siebold pegou uma chaleira e derramou um jato de chá quente em duas pequenas xícaras de porcelana. Ofereceu uma à mulher, que agradeceu enquanto depositava os dedos sobre o vidro quente, sentindo o vapor doce subir até suas narinas.
O moço puxou uma cadeira e sentou-se, cruzando a perna direita sobre a esquerda. Tomou um gole e sentiu o líquido quente afagá-lo em meio ao frio do lado de fora. Os chuviscos tocavam o vitral da janela, por onde transpassava um fino feixe de luz. Ele depositou a xícara no pires, respirando fundo.
— Não penso que veio até aqui só para tomar um chá comigo. — ele murmurou.
Sienna revelou um sorriso.
— Eu gostaria. — disse, deslizando o indicador pela xícara. — Mas não.
Eles trocaram olhares por alguns segundos.
— Eu vim pelo meu desafio. — falou ela, por fim.
O rapaz pareceu contar até dez mentalmente. Os olhos escuros ainda o fitavam, aguardando uma reação.
— Seu desafio foi há um longo tempo, Sienna. — ele tomou mais um gole. — Você se lembra do que disse naquela época.
— Eu disse que não estava pronta.
— Bobagem. Mas sim. Sua oportunidade já foi. Infelizmente.
— Não pela legislação de Kalos.
Ele colocou a xícara de novo na mesa. Os olhos fixos em si eram desafiadores, provocativos. Ela sabia o tom que a conversa tomava, e parecia se divertir ligeiramente com o jogo de palavras. As pausas pareciam recheadas de pensamentos perdidos.
— Quando?
— Quando for possível. Provavelmente em não muito tempo.
Ele uniu as mãos em uma pirâmide.
— O que espera que eu diga?
Sienna suspirou, fazendo pequenas ondulações em seu chá.
— Eu, sinceramente, não sei. — admitiu, séria. — Não vim pedir permissão. Vim comunicá-lo. Como uma amiga.
Siebold abaixou a cabeça em um sorriso
— Uma amiga… — ponderou.
O moço balançou a cabeça negativamente.
— Ser campeão não é uma escolha que você faz em um dia de iluminação. É um fardo. E o escolhido deve arcar com as consequências sem fugir.
— Eu não fugi, Siebold. — ela deu um golpe na mesa com a palma da mão. O movimento não foi tão brusco, mas as paredes amplificaram o som de maneira que parecesse um estouro.
Sienna encarou o vapor quente da bebida se dissipando e brincando no ar.
— Eu só… Eu só precisava de tempo.
O outro passou a xícara por entre as mãos, segurando com firmeza.
— Teve seu tempo. — ele murmurou, levantando o olhar. — Mas não pode esperar que o resto do mundo tenha congelado esperando por você.
A moça tentou decifrar seu olhar, mas ele parecia tentar escondê-lo, como uma criança. Desviava para o lado, incomodado pela pressão. Mas ela não parava de encará-lo.
— É um pedido de desculpas que você esperou por todo este tempo? — indagou ela.
Siebold tomou um longo gole.
— Achei que fosse… Mas não acredito que desculpas curem tudo.
— …porque eu não iria me desculpar.
Ele a encarou. Sienna se levantou e ficou de costas, pensativa. Encarou uma estante de livros. Seus dedos longos e finos dançavam por entre as lombadas de cores e tamanhos diferentes.
— Eu precisava de tempo. Precisava amadurecer. Tudo aquilo era muito pra mim. — falou, quase que em uma melodia. — Hoje sei o caminho que quero e devo tomar. E estou aqui porque queria que você soubesse antes de qualquer outro.
Ele se apoiou na mesa com os braços. Ouviu com cuidado cada uma das palavras. Espinhos.
— Aprecio seu gesto. — falou, em um tom sincero. — Apenas não esqueça que sou um obstáculo para sua nova decisão.
— Você sempre foi. — ela sorriu. — Um atalho e um obstáculo.
Os saltos ecoaram conforme ela se aproximava. A cada passo mais perto, mais parecia que a pressão do espaço se comprimia e a sala ficava menor – como se as paredes se encolhessem. Ela lhe tocou no ombro, ainda apoiado na mesa.
— Minha função é impedi-la com todas as minhas forças. — murmurou ele.
— Não esperava nada menos. Não esperei tanto tempo para pedir piedade. — ela falou, tocando suavemente os dedos por suas costas. — Mas na próxima vez que pisar neste lugar, só sairei com a coroa de Campeã.
— Quero saber quem, por obséquio, deixou a toalha molhada em cima da minha cama!!
Os brados de Calem se perderam no campo aberto, mas com certeza de suficiente distância era possível ouvi-los. Alguns Fletchling se assustaram, voando em bando para longe. Charlie coçou a cabeça um pouco sem jeito.
— Ops.
Calem saiu de dentro do casebre balançando os braços em nervosismo. Sua expressão de poucos amigos se virava para os lados, procurando pelo transgressor. Ao avistar o rosto culpado de Charlie, os olhos semicerraram, como um predador que acaba de notar a presa.
— Ora, Charles…
Ele jogou a toalha no chão, soltando um rugido de desgosto. Charlie e Serena ficaram por alguns momentos fitando o garoto. Não era raro Calem estar estressado – especialmente nos últimos tempos – mas, naquela ocasião, ele parecia particularmente incomodado em um nível diferente.
— Por que você está tão estressado? — perguntou a menina se aproximando.
— Você quer saber, Serena? Bem, porque faz um mês que estamos nos escondendo em lugares péssimos, tipo esse sítio de um desconhecido…
— Cal, não fale assim do senhor Barnett, ele está sendo um amor em nos deixar ficar aqui!
— …morrendo de medo de sermos apanhados pela máfia do seu pai! — resmungou ele. — Bem, desculpe se isso me estressa, mas é que É ESTRESSANTE MESMO.
— Cal, eu sei fugirmos foi uma decisão… Difícil… — ela suspirou. — Mas a gente fez a coisa certa.
— Para quem, Serena?
— Para nós mesmos.
— Todos os dias a mesma discussão. — murmurou Charlie para si mesmo.
Calem balançou a cabeça.
— Existiam outras formas de resolver aquele problema. Que não incluíam explodir um salão e cuspir na cara do seu pai.
— Você foi muito corajoso fazendo tudo isso... — disse ela, tocando-lhe o ombro.
— Serena, eu fico realizado que conseguimos impedir que o casamento acontecesse. — disse o garoto, respirando fundo, retirando com leveza a mão da garota de seu ombro. — Mas é muito difícil pra mim lidar com todas as consequências disso.
O garoto saiu caminhando, e ela queria chamá-lo de volta, mas sabia que não deveria. Não adiantaria. A mesma discussão já perdurava havia semanas. Uma decisão tomada impulsivamente às vezes custava tempos em suas consequências. Ela não estava totalmente satisfeita com os rumos que sua jornada tomou, mas sabia que era melhor que a segunda opção – casada em Vaniville ao lado de sua família. O rosto de Stevan ainda lhe assombrava algumas noites, quando ela tinha pesadelos.
O pequeno Baa Mer Ranch era um espaço comandado por Barnett, um senhor simpático que permitiu que os jovens ficassem por algum tempo. Ele não fazia ideia do real motivo pelo qual estavam lá, mas eles sentiam que era melhor assim. Saber demais poderia deixá-lo em problemas. Além disso, o velho senhor evitava muitos meios de comunicação – se por um lado isso reduzia a ansiedade em evitar as notícias, por outro pareciam enlouquecer sem saber de nada.
Provavelmente a polícia estaria em busca deles nos arredores. Por mais que escolhessem um lugar retirado, sabiam que as coisas não eram as mesmas. A apreensão às vezes sufocava. Os momentos se tornavam angustiantes. Dormir às vezes era uma tarefa para Serena: ela sabia que poderia acordar com seu mundo se desfazendo diante de seus olhos a qualquer momento.
Calem sabia isso mais que ninguém. Se martirizava. Para o garoto, era como uma ampulheta. Estavam apenas evitando um final certo. Stevan iria encontrá-los. Poderia levar horas ou poderia levar anos, mas ele não desistiria. Não sem antes recuperar sua herdeira e se vingar do primo que a afastou de sua sina.
A menina se encarou em uma pequena poça. Às vezes ela ainda tomava um susto. Tinha o tique de mexer no comprimento de seu cabelo, mas agora ele já não tinha o mesmo tamanho. Ela o cortou. Primeiro porque queria dificultar que fosse reconhecida. Contudo, principalmente, porque sentia que precisava fazer aquilo. Ela não era mais a mesma. Não se sentia mais a mesma. Às vezes, quando fechava os olhos e ouvia os doces sons da natureza do rancho, era como se fosse transportada para os primeiros e inocentes dias de sua viagem…
…Mas quando abria, sabia que eles foram um momento passado. Talvez aquela Serena estivesse morta. Quantas mortes cabem dentro de uma vida?
— Seu Skiddo está tão feliz brincando com os outros… — ela comentou.
Charlie saiu de seu transe. Vários outros da mesma espécie brincavam com seu Pokémon. O senhor Barnett era especialista em criar produtos derivados do leite de Skiddo, então criava um considerável grupo. O de Charlie era um pouco agressivo nas brincadeiras, de maneira que os outros ficassem um pouco intimidados em acompanhá-lo.
— Dê um tempo pra ele. — disse Charlie, sem encará-la. — Lidar com essa pressão enlouquece.
Serena se apoiou no cercado ao lado do amigo, fitando os Pokémon correndo pelo pátio.
— Desculpe por arrastá-lo para tudo isso. — disse ela, como um devaneio.
— Eu? — ele balançou a cabeça. — Ora, eu fujo já faz anos. Fugir da polícia, fugir de um milionário, apenas detalhes.
Ela abriu um falso sorriso, tentando comprar a brincadeira. O rapaz era o único que não balançava com a situação. Mais que nunca ela compreendeu como Charlie era importante para o grupo – quando os primos pareciam desmoronar, ele aparecia com leveza e perspicácia. Ele deveria ser o a temer mais, pois tinha tudo a perder; Stevan não devia nada a ele. Porém, se isso o assustava, ele não demonstrou. Seus olhos verdes continuavam igualmente impassíveis e misteriosos por todas as semanas, se adaptando com relativa facilidade à nova realidade.
— Charlie...
Ela virou o olhar a ele.
— Quando meu pai e eu conversamos pela primeira vez, desde que eu voltei pra casa… Ele me mostrou uma carta. Uma carta que você entregou a ele.
Ele abaixou um pouco a cabeça, mas ela continuou o fitando. Talvez esperasse por algum sinal, alguma hesitação, alguma emoção. Mas, mais uma vez, ele nada esboçou. Os olhos da garota pareciam implorar para que aquilo fosse mentira, mas ambos sabiam que havia acontecido.
— Por quê?
— Eu queria tentar contornar a situação. — ele murmurou baixinho. — Não queria que ele a mandasse de volta.
— Você poderia ter falado comigo, Charlie.
Desta vez ela o tocou no rosto. Sentiu um leve arrepio na pele do garoto quando ele foi obrigado a se virar para ela, com o leve toque dos dedos da menina, tão macios que pareciam usar luvas. Agora ele parecia ter menos o controle da situação
— Meu pai fez perguntas sobre você. E me machucou demais que eu não sabia respondê-las.
— Serena, minha vida é um tanto… — ele respirou fundo. — Confusa. Eu não gosto de trazer essas coisas à tona.
Ela balançou a cabeça.
— Charlie, olhe onde nós estamos! Eu não sou mais uma desconhecida te pedindo informações sobre a próxima cidade. Meus riscos sãos os seus. E os seus também são nossos. Eu só quero que você seja sincero comigo!
Desta vez ela sentiu a hesitação em seu olhar. Parecia suplicar para que parasse, como se ela pedisse por algo que ele nunca poderia entregar. Era difícil dizer não para aqueles olhos azuis marejados – ele sabia que machucava.
Charlie tocou sua mão na dela e a abaixou, colocando em seu peito. Ela sentia as batidas descompassadas e incertas.
— Você confia em mim?
A resposta demorou a vir. Qual era a verdade e qual era a resposta certa? Que escolha ela tinha àquela altura? Ela suspirou e acenou que sim com a cabeça, com tanta leveza, como se não tivesse outra opção.
— Então, por favor, acredite em mim, Serena. Eu lhe prometo que essas perguntas eu vou responder no momento certo.
— Quando é o momento certo, Charlie?
— Só confie em mim. Eu vou responder.
Suspiro.
O vidro embaçava com a respiração da garota. Por trás da janela, avistava a campina onde os Skiddos brincavam e corriam livremente. Àquele momento, alguns se escondiam da tempestade que aparentava se formar ao longe. A caída da tarde tornava o quarto onde a garota repousava relativamente escuro.
Em torno de seus braços, tinha um ovo Pokémon. Não fazia muitas semanas que Serena o recebera. Tiveram a sorte de esbarrar com Aldrick e Katheryn acidentalmente quando os dois se dirigiam à próxima cidade. O garoto louro lhe entregou de presente, quase que em uma tentativa de reanimar Serena. Os dois não evitaram um espanto quando se depararam com seus amigos novamente. Estavam abatidos, assustados. Não era mais o mesmo trio de sempre.
Ela afagou o ovo em seu corpo. Era curiosa a sensação de pensar que por trás daquela grossa casca havia um ser vivo em formação. Por mais que tivesse um grupo de Pokémons consigo, nunca experimentou a sensação de ver uma criaturinha nascer diante dos seus olhos. De fato Aldrick estava certo. A esperança em ver aquele evento lhe dava energias boas para continuar a jornada.
As últimas semanas foram da mais amarga agonia. Por mais que as coisas continuassem razoavelmente as mesmas, a tensão que agora nos atingia era uma triste novidade. Eu não via meu pai desde o dia do casamento, que felizmente nunca aconteceu. Contudo, no silêncio, eu quase conseguia ouvir sua voz irada e sua mão socando a mesa do escritório. Aquele olhar de repressão estava sempre grudado na minha cabeça.
Os meninos sempre tentaram me proteger, mas chegou um momento em que isso parou de ser suficiente. Eles sabiam que corriam tanto perigo quanto eu. Por mais que tivéssemos feito aquela fuga em equipe, os dois pareciam distantes um do outro. Mais que o normal. Calem estava preocupado e insatisfeito. Eu sei que ele não me culpava, mas de certa maneira eu não conseguia afastar a ideia que eu sempre o arrastava de volta para meu conflito com meu pai. Nossa jornada começou por causa disso. O quase-final de nossa jornada foi por causa disso. E, agora, nossa fuga também era pelo mesmo motivo.
Charlie parecia mais sério. Ele sempre teve um lado descontraído, mesmo diante das situações mais adversas. Mas, dessa vez, eu o flagrava quase tão assustado quanto nós. Ele mentia, fazia uma piada, tentava me colocar para cima. Infelizmente eu já o conhecia o suficiente para saber que o desespero também o perseguia, por trás dos sorrisos tortos.
No fundo nós três sabíamos que aquilo era uma ampulheta, cada grão de areia nos arrastando para mais perto de meu pai. Ele com certeza assistia a tudo com gosto, contando os segundos para nos ter de volta. Eu sabia que esse dia chegaria.
O mistério era em como me antecipar para este evento.
 
O passar das semanas exigiu que Calem aprendesse algumas coisas novas.
Navegar em um pequeno barco seria algo impensável alguns meses atrás. Mas agora o garoto tinha muito tempo livre – e precisava se ocupar com algo que não o fizesse enlouquecer. Aos poucos reduziu seu medo e passou a conhecer melhor algumas das ilhotas ao redor da Rota 12. Não havia nada muito além de pedras e cavernas pequenas, mas eram interessantes. Elas pareciam estar conectadas a certo misticismo da região.
O senhor Barnett havia contado que, segundo lendas, uma das cavernas era habitada vez ou outra por guardiões dos oceanos. Ele mesmo havia testemunhado o que parecia uma ave em chamas outrora, mas nunca teve como registrar se não na memória. Isso tudo intrigava o garoto. Para além dos assuntos que o consumiam com Serena e Charlie, ele ainda tinha uma curiosidade guardada acerca do universo em que viviam.
Calem caminhou pela areia com suas botas. Aquela em especial era uma de suas pequenas ilhas favoritas. Não que ele tivesse desbravado muito mais – o Azure Bay era um canal repleto de habitações de terra espaçadas pelo mar – mas já conhecia duas ou três a poucos metros de distância do rancho onde passaram os últimos tempos. O tempo estava fechado – um céu cinza apático, que indicava que, em algum momento, talvez distante, uma tempestade cairia.
O garoto adentrou uma pequena caverna. Outrora reclamaria mais, mas o fato de ser bem pequena – quase uma gruta – fazia com que não se incomodasse muito. Havia uma pequena lagoa, que se comunicava ao fundo com o oceano. Ele apreciava como havia alguns sinais nas paredes, como se grupos ancestrais tivessem deixado vestígios naqueles ambientes pouco explorados.
Agachou para fitar as águas, e logo semicerrou os olhos para enxergar com melhor precisão. Parecia avistar algo brilhante bem no fundo, mas a água era turva àquela penumbra, dificultando que tivesse certeza. Era como um pontinho verde reluzente, que gradualmente se aproximava.
— O que é isso?
A luz se deslocou, indo em direção ao mar. O garoto correu para fora da caverna, acompanhando o trajeto. Era possível avistá-la, mas a velocidade com que se movia chamou sua atenção. Instintivamente, subiu no barco e ativou o motor, indo em direção a ela. Seus pensamentos traziam dúvidas – seria apenas um Pokémon predador tentando atrair uma presa? De qualquer maneira, ele não pretendia ir muito mais longe. Logo anoiteceria, e com certeza não era uma boa ideia ficar perdido no Azure Bay após a fuga do sol.
O ponto de luz desapareceu na imensidão do mar quando o garoto se aproximou de uma próxima ilhota. Logo estacionou o barco na areia e correu para fora, rumo a uma nova gruta, pensando se avistaria aquele curioso fenômeno como na outra vez. Poderia ser só um Chinchou ou um Finneon, mas algo em sua intuição contrariava essa ideia.
Quando olhou para baixo, não havia nenhuma conexão com o mar. Ele não disfarçou uma expressão de desagrado por ter perdido aquele pequeno ponto de luz. Contudo, os fundos da gruta davam em um buraco curioso que não chegava nas águas, mas parecia seguir em terra. Por mais que tentasse ver, seus olhos não avistavam a real profundidade daquele buraco.
Subitamente, sentiu um arrepio em sua espinha instintivo que seus sentidos dispararam. Assemelhava-se a um rugido, tão distante e abafado que não era possível afirmar o que era com certeza – mas ele podia garantir que não se parecia com nenhum Pokémon que já conhecesse. Um urro agonizante perdido na terra. O barulho surgia tão das profundezas que era impossível dizer se de fato era alguma criatura que o reproduzia, mas uma coisa Calem teve certeza: não deveria estar ali, e aquele era o sinal de que precisava ir embora.


Com o coração acelerado, correu o mais rápido que pôde até o barco. A adrenalina fez com que mal contasse os poucos passos que precisou para alcançá-lo. A audição aguçava, por mais que sentisse o palpitar cardíaco abafado – e o rugido perdido em suas memórias ainda frescas. Ligou o motor, que falhou algumas vezes, e foi rumo ao rancho. Não tardou muitos minutos para isso mas, naquele momento, cada segundo parecia vital. Olhava para trás, vez ou outra, mas estava sozinho. Apenas o ribombar de trovões ao longe, estalando em raios que cortavam o céu fúnebre.
Calem alcançou a terra novamente e correu até o rancho, só então descansando o corpo nas próprias pernas, respirando pausadamente. Ainda sentia o sangue correr agitado, o corpo em estado de alerta. Que diabos era aquilo? Mas sabia que ali estava a salvo. Ou, pelo menos, era o que pensava.
— Onde você estava?! — indagou Charlie, com uma mochila nas costas, com uma expressão em choque.
Antes que Calem pudesse responder, sua prima apareceu, igualmente atordoada, com várias coisas em mãos.
— Estão vindo para cá. — disse, simplesmente.
O coração do garoto voltou a sentir a agitação. Ele nunca descansava da tensão nas últimas semanas. Finos pingos de chuva começavam a respingar sobre a cabeça. Seus olhos se revezaram entre as duas figuras e, após conseguir formar uma frase com a respiração ofegante, inquiriu:
— Como você sabe?
— Um morador da cidade do lado comentou sobre uma equipe patrulhando os arredores. — respondeu Charlie.
— Então temos um tempo para despistá-los. — falou o garoto, voltando ao normal, pronto para pegar suas coisas. — Para onde vamos agora?
Coumarine City. — complementou o outro. — E depressa!

    

Notas do Autor - Interlúdio


"Não espero demorar muito agora com esse hiato entre temporadas" - disse eu um ano atrás. 

Bem-vindos, oficialmente, à Saga Y, a segunda temporada de AeXY!

Após muitos e muitos meses de planejamento, escrita e reescrita, rascunhos... Finalmente podemos dizer que a nova temporada está tendo início. Tive um cuidado especial com esse Interlúdio, porque é sempre difícil retomar um começo após um "final", mesmo que temporário. Eu já tinha um rascunho desde o final da Saga X (vocês acham que é só porque eu levo um ano pra postar que eu não me preparo? Não é bem assim, ok?), mas por muito tempo ele me incomodou. Felizmente algumas ideias foram se transformando para que eu pudesse deixá-lo de uma forma que de fato ficasse satisfeito.

Este capítulo é apenas um vislumbre do que vem por aí. Aqueles que já leram A Menina que Roubava Livros talvez tenham memórias boas, pois foi uma inspiração necessária. "Quando a morte conta uma história, você deve parar para ler". Lysandre até então fez apenas uma ponta como um cientista colega do Sycamore, mas este é um personagem que ainda terá uma participação notável nessa Saga. Tramas com lendários e facções às vezes são meio que consideradas clichês, uma eterna dicotomia do bem contra o mal permeada por uma dose de mitologia. Contudo, confesso que sou extremamente apaixonado por essas tramas dentro dos jogos. Por mais que vejamos de maneira singela nos game (e mais ainda no anime), penso que tudo esconde muito mais que podemos ver (eu sou grande fã dessas teorias de conspiração dentro dos jogos de Pokémon ~rsrs). Não gosto de apostar todas as fichas nos lendários, mas prometo fazer valer com aquilo que estou chamando atenção. Foram em momentos extremamente pontuais em que vimos o Team Flare e os lendários... Isso porque tudo esteve sendo preparado com muita cautela, sem afobação. Quando a hora chega... Nem a Morte pode fazer nada a respeito.

E, pasmem, semana que vem tem capítulo novo! Espero que gostem desse pequeno prólogo, porque é só uma aquecimento pra tudo o que ainda teremos nas próximas semanas! Um grande abraço a todos (e grande obrigado pela paciência de esperarem até hoje) e que comece a Saga Y!

Interlúdio


INTERLÚDIO
Caos
I
Morte.
Palavra curiosa. Cinco letras – duas vogais, três consoantes. Um significado tão potente e abstrato... A morte é o grande medo dos humanos – o que é irônico, pois todos irão morrer. A única certeza que todos podem ter, absolutamente, é de sua finitude. O que é o nascer, se não o início do processo de falecimento?
Intriga-me como os humanos veem seu fim. Confesso que me divirto. Já conquistaram terras, inventaram dispositivos mas, por milênios, seguem perplexos com o fato do final de sua existência. Já a retardaram, evitaram, tentaram fugir... Mas, mais hora, menos hora, não conseguem mais correr. É inevitável. Sempre os encontra.
Desde os tempos mais ancestrais até os mais modernos, todos procuram explicar tal fenômeno. Ciência, religião, sobrenatural. Apoiem-se onde quiserem, os humanos se mobilizam para explicar aquilo que não conhecem. Isso devo reconhecer e admitir que admiro. Como descrever um fenômeno tão abstrato quanto a própria vida?
Quando se atribui significado à sua existência, é questionável que ela precise chegar ao fim. Os humanos, que se autodenominam superiores aos demais, procuram a resposta para seu tempo marcado, aquilo que mais os torna diferente dos deuses que um dia sonham ser. Penso eu que talvez essa vida talvez só signifique algo justamente pela finitude.
Desgosto de linearidades, de polarizações. Mas, se insistem, posso pensar na morte como um ponto final, pois então. Nascer, viver, morrer. Vens ao mundo chorando, e o deixa com as lágrimas nos olhos de outrem...
...Mas a morte não é o mal. Penso às vezes que a vida pode ser tão mais cruel... Tudo depende de como aplicas tua existência, do que faz com teu viver. Como sente cada um dos segundos em que o ar passa pelos seus pulmões. A morte é o silêncio, a paz. A conclusão. Barulhenta basta a vida. Tumulto? Não, muito obrigada.
A morte não é assustadora. Olhe para mim. Sou tão velha quanto a vida. Apenas uma moça de manto vermelho, que avisa àqueles que seu momento chegou, roubando-lhes seu ar como um beijo. Todos se queixam, pois ainda lhes restam pendências. Todos tem pendências. Não posso esperar, desculpe. Sou ocupada. Posso ser só uma mensageira, mas entrego o que prometo.
Ainda que ocupada, gosto de parar para ver o que acontece com os humanos. São intrigantes, cheios de ideias. Como um conjunto de milhares de átomos forma uma criatura consciente de sua própria existência? Explique os humanos como quiser, não me imponho a responder qualquer pergunta. Gosto é de admirar.
II
Observei o rapaz, entretido em seus pensamentos mundanos. Os cabelos ruivos grandes e espetados, um tanto sem brilho. Parecia cansado. Os olhos já caídos, imersos em olheiras tão escuras que nem a melhor das noites de sono resolveria. Afagava-se em seus grossos e felpudos trajes – sabia que Kalos fazia frio naquela época. Eu podia ler "Prof. Dr. Lysandre" em uma placa pequena desgastada na mesa.
Espaçoso seu laboratório. As paredes escuras metálicas se estendiam muitos e muitos metros acima, iluminada por refletores de tom rubro. Tantos canos que poderia perder a conta, tubos, máquinas, que já nem saberia dizer eu para que serviam. Não me interesso muito pela tecnologia mortal. Admiro, mas não me interesso.
O que lhe aflige, caro humano? — digo, sorrindo.
Ele ignora e me responde com seu silêncio. Acho divertido. Aguardo alguns segundos antes de retrucar.
Vamos, fale comigo. — peço, com simpatia. — Já me tens amordaçada. Quero apenas entreter-me.
Ele finalmente me concede a honra de seu olhar. Vejo os olhos vermelhos me encarando com incerteza. Deve ver uma ave de asas capazes de abraçar a destruição, tão grandes e nefastas que intimidariam qualquer um, se não estivessem contidas quase em formato oval; garras pontiagudas ameaçadoras; um par de chifres apontando diretamente em sua direção, tais quais um par de olhos translúcidos, de um tom de azul que nunca encontraria em seu plano mundano – que lhe liam a alma quando encarava. Mas, acredite em mim: sou apenas uma senhora repousando.
— A podridão do mundo. — responde, por fim, soltando suas palavras como uma pedra que tentava fazer pular nas águas de um lago qualquer.
Sua mão levanta um fruto, brilhante e colorido que estava no ápice de sua maturidade. Nem precisava prová-lo para imaginar sua suculência. Disparou-o sobre mim, atravessando por entre o campo de força que nos separava. Segurei com cuidado entre o pouco que era capaz de movimentar as mãos – ou asas, se preferir. O fruto tão pequeno escureceu, definhou-se como uma esponja que era pressionada, perdendo todo o seu conteúdo.
— Como a cor desse fruto, antes brilhante e agora opaco e azedo. — prosseguiu o homem.
Ficamos em silêncio. Observei o fruto podre com cuidado, manejando-o.
Sabe o que “Kalos” significa? — lhe pergunto.
Ele assente, sem nem precisar me encarar.
— Vem das línguas ancestrais. — responde com segurança. — Significa “eterna beleza”.
Com o acerto, veio uma risada escrachada que não esperava que pudesse ecoar pelo salão. Balança a cabeça, em negação, baixando o tom para si mesmo. Mas, se não devia, escuto mesmo assim sua lamúria.
— Como se qualquer beleza fosse eterna...
Ele caminha pelo salão e acompanho seus vagos passos desalinhados, perdidos. Vejo sua alma, vejo que está distante. Deve ser difícil para vocês, humanos, viver das aparência dos outros, sem saber o que lhes passa na cabeça. Ou, pensando bem, talvez seja uma benção. Não sei se aguentariam a intensidade de conhecer os fantasmas dos outros. Já é difícil lidarem com seus próprios.
— Toda beleza chega ao seu apogeu e se degenera. — disse o ruivo. — Sabe melhor que qualquer um do que falo.
Não sei se ele percebe, mas desenho um sorriso.
A história de vocês, humanos, é essa: um eterno conjunto de loucuras que fazem por não aceitarem o tempo das coisas. exclamo com gosto. — Tudo o que um dia recebem lhes é tirado. É assim que funciona a ordem das coisas. É assim que o mundo funciona, com equilíbrio.
Ele fica em silêncio e levemente concorda com a cabeça. Não se ofende com minha confissão, não rebate. Apenas engole serenamente, como se já soubesse de tudo aquilo. Como se pensasse o mesmo de sua própria raça imperfeita e tivesse de aceitar essa maldita verdade.
— Todos temos dificuldades de lidar com finitudes. — fala, pensativo. — De que às vezes as coisas precisam chegar a um fim.
Ele estende a mão e arremesso de volta o fruto. Ele pega com um movimento preciso e observa a casca escura e apodrecida, a textura seca e áspera. Passa entre os dedos. Sente.
— A beleza só se torna eterna quando acaba antes de apodrecer. —  diz, abrindo um sorriso frágil. — Que paradoxal... — suspira. — Mas se destruo esse fruto antes que chegue a apodrecer, ela permanecerá para sempre bela, pois nunca se definhará.
Apenas ouço. Observo suas veias ganhando relevo conforme força os dedos, pressionando a fruta. Os nervos de seu rosto se contraem com o esforço e vejo a fruta ser esmagada, partindo-se em pedaços imperfeitos e mofados, tornando-se apenas restos do que um dia foi. Ele vê a sujeira com calma, demorando a descartá-la.
— E ,quando algo chega ao fim, é possível que recomece novamente, até que definhe, e assim o universo segue. — pondera, por fim.
Ele se esgueira mais uma vez sobre sua mesa, e não digo uma palavra sequer. Vejo os restos daquele fruto, e o ruído dele se partindo é a última coisa que permanece ecoando em minha audição. O homem abaixava a cabeça e vejo seus demônios o assombrando, brincando em suas costas; vejo sua luta.
— Qualquer vitória nesse mundo é inútil. — balbucia. — Como peixes em uma rede. Todos vemos o caos acontecendo e destruindo a todos nós, mas teimamos em ser cegos. Vemos o mundo apodrecer cada dia mais e cruzamos os braços, sem coragem de fazer qualquer coisa a respeito.
Ele suspira e me olha. Os pensamentos estão embaralhados e ele me poupa dos ligamentos; mas quando olha em minhas orbes azuis, sabe que eu sou capaz de juntar todas as peças. Ele não explica pois sabe que posso ver além, posso entendê-lo, sei do que fala. Ele apenas suspira, sem muito o que fazer. Ninguém pode me enganar.
— Vossa divindade sabia que esse dia chegaria. — por fim fala, como o peão do destino que é.
Com os braços, mais cruzados que nunca, me movimento levemente, dando de ombros. Disfarço um sorriso.
Nem a Morte pode desviar uma profecia de seu destino. — concordo.
Ele sorri também, quase vitorioso, mas ainda tímido. Mesmo as lendas sucumbem ao poder do Destino, são subjugadas às vontades maiores. A alguns isso é uma benção; outros, quando se dão conta disso, têm pesadelos.
Eu me abstenho e deixo-os escrever sua história. — retruco, entregue. — Vocês humanos não se conformam com sua mortalidade, gostam de brincar de deuses. — exclamo com um sorriso. — É assim que todos vocês se atraem à sua sina desde os tempos mais primordiais. Confie, sei mais que ninguém do que falo.
Vejo seu rosto perder a serenidade e ser tomado pela desordem. É ali que entrega sua humanidade; é ali que percebo sua ofensa, pois no fundo é aquilo que já disse: humanos não gostam de lembrar que o são, odeiam aquilo que lhe lembra que não são deuses. A Morte sempre os lembra disso, ela é a maior prova de que não importa o quão distante foi em vida, o final é sempre o mesmo.
— Ser do Caos... Sabes que não é uma brincadeira. — diz ele, por fim, balançando a cabeça, segurado com firmeza sua mesa. — Está por vir, está perto.
Vejo seus olhos deslizarem para a lixeira, encarando os restos do fruto apodrecido e despedaçado.
— O Caos é apenas o que antecede uma nova ordem... — suspira.
Sorrio, pois é só o que posso fazer em minha posição. Diferente de vocês, aceito quando não estou no controle. Divirto-me vendo as peças serem movidas no tabuleiro; é cômico. Aquele dia chegaria e nada podia fazer a respeito. Ahh, humanos… Sempre cheios de histórias.
Eu gosto de histórias. E, acredite em mim, já vi de todas, o suficiente para qualquer mortal perder a sanidade. Mas aconchegue-se aqui, acomode-se; tenho agora tempo de sobra para lhe contar uma das boas. Gosta de profecias? Pois conto-lhe a que nos assombra, então. Já não me recordo suas palavras exatas, então direi com minhas próprias. Não espere por rimas e poesias, não sou disso. Chegamos a este capítulo memorável com uma história que a princípio parece tão simples quanto um conto de fadas. Mas não subestime, as jornadas mais memoráveis começam assim.
Com a décima terceira hora
No terceiro Levantar
O casulo e a árvore
A destruição e a gestação
Em Caos se alinham à Ordem
Quando as profundezas vierem à luz
Dado está o Crepúsculo dos Deuses
Mas tudo começa com a história de três:
Um sábio com muito a aprender;
Uma princesa aprisionada;
E o criminoso que os trai.



       

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